terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Em tempestade

By Ricardo Neto
Ali estava ele, sentado no banco daquela praça em baixo de um ipê amarelo que não mostrava mais as suas flores resplandecentes devido ao frio inverno que o fizera parecer seco como qualquer outra árvore morta. Ali ele esperava por algo que certamente não aconteceria. Cerrou os seus olhos e cabisbaixo lembrou-se de coisas de algum tempo atrás. Exclamou em um leve murmúrio - Ontem! Aqueles momentos que um dia existiram, mas parecem frutos da imaginação - Estes momentos passados agora estavam na sua cabeça fazendo sentir o que a muito não sentia. Por um pequeno instante sorriu, mas logo voltou a si fechando os seus lábios.

Era capaz de prever o que o aguardava e sentia muita pena de si pelo seu destino, queria descordar de suas previsões, pois não acreditava em destino acreditava apenas que fez as escolhas incertas, que tomou as decisões erradas e seguiu o caminho que não deveria andar, mas pelo fato de já se sentir culpado por sentir pena de si preferiu jogar a culpa de tudo no destino. Refletiu um pouco a cerca de suas escolhas e se questionou se os problemas se davam pelas suas escolhas ou por conta de toda a sua resignação perante a toda pujança e recusa alheia que sempre sofreu.

Acendeu um cigarro e tentou dar tempo ao tempo para ver se esquecia das suas dores, não teve jeito, tudo lhe parecia tão obscuro que nem por um momento conseguiu clarear as suas idéias. Deu uma tragada mais longa do que o normal para ver se isto o acalmava, foi em vão. De certo nada no mundo tiraria a sua preocupação somente aquilo que ele mais desejava e que, talvez, jamais poderia conseguir. Levantou-se e começou a caminhar lentamente pela praça enquanto consumia o cigarro ferozmente olhando, por entre a fumaça de suas baforadas, a multidão atônita que passava diante dele correndo como formigas de um lado para o outro sem um rumo certo.

Ele continuava ali como que se estivesse congelado perante as imagens em movimento. Estática era a sua situação, imutável como o caminho da vida perante o tempo. Hoje a sua sombra o acompanhava não pelo fato da luz não poder traspassar o seu corpo e provocar o efeito da sua imagem sobre o chão, não, a sombra hoje era o retrato da sua alma negra, fria e vazia assim como um túmulo esquecido no meio de um cemitério onde o seu corpo era o único que apodrecia sem ao menos a dignidade de ser lembrado. O cigarro se acabava lentamente assim como os minutos que se arrastavam quase mortos dando um tom mais soturno a pressão que lhe sufocava.

Nada podia ser mais torturante do que ver a expressão alegre nos rostos dos casais que se encontravam naquela praça, não pelo fato de suas alegrias, mas pelo simples fato de não poder ter tudo o que eles compartilhavam. Bem lá no fundo ele os invejava. Assim seguia, relutava, lastimava, pois a sua forte vaidade não lhe permitia que ele sentisse inveja com isso o fazendo alguém menos humano, com menos sentimentos, com menos desejos e com menos emoções. Seguia no seu conflito na sua guerra interior, com toda sua fúria represada a olhar atentamente tudo exatamente tudo que se configurava sua volta.

É verdade que todos os homens têm o seu fado e o seu fardo, mas para ele quase nenhum se igualaria ao seu. Por quê? Por que são poucos aqueles que foram privados de viver as coisas certas no tempo certo e só ele sabia como isso machucava. Com tudo via a sua juventude esvair como areia entre os dedos sendo suas mãos a sua ampulheta. Nos seus quase trinta anos de vida sabia que não tinha vivido quase nada, que havia passado uma parte da vida escondido e a outra grande parte perdido. A única satisfação para ele era ver que havia se encontrado, mesmo que julgasse que esse encontro com sigo mesmo tenha acontecido tardiamente. Era satisfatório ter a clareza das idéias que tinha agora, sempre se sentiu diferente dos outros e antes era meio covarde em admitir suas idéias e pensamentos. Falava sobre coisas que, às vezes não eram compreendidas por outros da sua mesma idade quando mais jovem, pois os outros o achavam estranho e na maioria das vezes debochavam e não levavam a sério as suas palavras ou qualquer outra coisa que propusesse. Talvez por esse motivo se escondia e deixou por muito se perder, pois não lutava e nem mesmo se confrontava com os outros, mas isto por um simples motivo, a necessidade de ser aceito e com isto tentar diminuir o seu isolamento.

Enquanto o céu se acinzentava com nuvens carregadas, ele continuava a caminhar lento e triste. Seus sonhos cada vez mais se distanciavam devido a improvável realização dos mesmos diante de todos os fatos que lhe envolviam.

As primeiras gotas gélidas caiam do céu e começavam a tocar sua face sem expressão. O seu coração carregado de sentimentos guardados o atormentava fazendo sua alma gemer. A cabeça continuava inquieta e as imagens que chegavam a sua mente eram frenéticas.

Os estrondos que anunciavam a atípica chuva naquele inverno não lhe causavam o mínimo espanto, pois já estava em tempestade que de tão grande se assemelhava ao mar em fúria sob mira de um tufão.

Explodiu como o temporal e chorou como a muito não fazia.

O seu pranto passou desapercebido no meio de todos que corriam, pois suas lágrimas se misturavam a água da chuva que escorriam pelo seu rosto.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Sozinho na profunda imensidão

Me encontro aqui sozinho
Na imensidão do meu castelo,
Esvaziando mais uma garrafa de vinho.


Meus pensamentos não mais se encontram nesta terra,
Se quer em outro lugar que não seja aquele,
Onde os nossos sonhos eram azuis e carregados de emoções.


Como areia lançada ao ar
O vento soprou e levou te de mim
Tudo se esvaiu... se foi... sumiu...


Por que tudo teve que ser assim ?

Contemplo teu quadro na parede
Que eu mesmo pintei
Com as lembranças que tenho de ti.

Mais uma vez lamento a ausência
Que me arremessou na grande escuridão
Me fazendo cada dia mais esmorecer.

Novamente falo com as paredes
Minha voz reverba intensamente
em toda a imensidão que me envolve.

Me perco novamente no vinho o seu doce me inebria
E me faz repousar na mais profunda alcova da mente
Onde tenho novamente tuas mãos sobre as minhas.

por Ricardo Neto